O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) decidiu, na sexta-feira (30/6/23), condenar o ex-presidente Jair Bolsonaro por abuso de poder político e uso indevido dos meios de comunicação, tornando-o inelegível por 8 anos.
A maioria dos ministros da corte eleitoral entendeu que o ex-presidente usou de sua posição de poder para descredibilizar o sistema eleitoral do país, sem qualquer prova. Mais do que isso, ele se valeu da estrutura da Empresa Brasil de Comunicação (EBC) para transmitir ao vivo uma reunião com embaixadores e dar imensa vazão às suas teses golpistas, aproveitando o alcance das emissoras públicas, disseminando desinformação. Esse uso indevido dos meios de comunicação, que é crime eleitoral, jogou luz sobre um debate central na democracia, que é justamente o papel da mídia pública, e ensina, principalmente, sobre o que governantes não podem fazer quando detêm o controle dessas emissoras.
No caso da EBC, é preciso esclarecer que a empresa foi criada para cumprir o artigo 223 da Constituição Federal, que prevê um sistema público de comunicação, que é diferente de outros dois sistemas: privado e estatal. A lei da EBC determina que sua finalidade é promover comunicação de caráter educativo, cultural, científico e informativo. E ainda criou mecanismos de autonomia e independência editorial em relação a governos de turnos, como ocorre nas melhores experiências de comunicação pública na Europa, América do Norte e outras regiões de democracia mais consolidada. Porém, infelizmente, parte desses mecanismos, como a existência de um Conselho Curador com participação da sociedade civil e mandato para diretor-presidente, foram extintos ainda durante o governo golpista de Michel Temer, em 2016.
Vale observar que, por força de contrato com a Presidência da República, a EBC também faz a gestão dos canais oficiais do Poder Executivo Federal, no âmbito do sistema estatal de comunicação. Mas, mesmo nesse sistema, o interesse público sempre deve prevalecer e a comunicação deve servir à divulgação dos atos de governo, em nome da transparência e da prestação de serviço público.
Nos últimos quatro anos, assim como em diversas outras áreas, o governo Jair Bolsonaro desvirtuou completamente o papel da comunicação pública para servir ao seu projeto de poder político e de promoção pessoal. A transmissão ao vivo da reunião com embaixadores foi um dos ápices desse processo, mas organizações em torno o da Frente em Defesa da EBC e da Comunicação Pública publicaram quatro relatórios sobre censura e governismo nas emissoras públicas ao longo desse período, documentando uma série de denúncias e emitindo alertas sobre os riscos desses abusos, que agora se provaram implacáveis contra seu principal agente.
Este episódio, além de mostrar que com a democracia não se brinca, deve servir de alerta para o real papel das mídias públicas, que é, em última instância, a promoção do direito humano à comunicação, por mais diversidade e pluralidade na esfera pública. Nesse contexto, cabe ao governo do presidente Lula corrigir a rota de desmonte e abuso que vinha sendo aplicada à comunicação pública e colocá-la efetivamente à serviço da sociedade, com diálogo e respeito aos preceitos legais e constitucionais.
Também seria importante que a EBC se manifestasse editorialmente sobre a condenação no TSE, assumindo publicamente o erro cometido no passado e se comprometendo a adotar medidas que impeçam que uma mancha como essa se repita na historia da comunicação pública.
Frente em Defesa da EBC e da Comunicação Pública